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O último voo do comandante Marcelino

O comandante Marcelino morreu em 19 de outubro. A sua biógrafa, Rita Tamagnini, presta-lhe uma merecida homenagem neste artigo.

Foi no dia 19 de outubro de 2012. Dia triste. Um dos maiores aviadores portugueses de sempre fazia o seu último voo. Na terra. Os céus sempre foram dele, desde que um dia, ainda menino, olhou para cima e viu passar um avião e um piloto, de cachecol a esvoaçar ao vento.
Quis ser como ele. E foi. Teve a vida que quis, como fazia questão de repetir vezes sem conta, até acreditarmos nele. E isso acontecia logo à primeira, tamanha era a convicção que levava a frase. Era assim que resumia os dias. Os muitos que passaram pelos seus 96 anos de vida. Dita na primeira pessoa, foi também essa a frase que deu título ao livro que escrevi sobre a sua vida (NR: “A vida que eu quis – TAP 264”, publicado em 2007), repleta de histórias que se confundem com a História do País e da aviação em Portugal, em geral, e da TAP, muito em particular: a sua companhia de sempre.
Foi um dos “11 de Inglaterra”, o grupo fundador de pilotos da TAP, e foi aqui que voou por mais de 40 anos, sendo, ainda hoje, admirado pelos seus pares. Em boa hora decidiu a Associação de Pilotos Portugueses de Linha Aérea homenagear um aviador de mão cheia que viveu como quis, a voar.
Uma história feita de paixão e profundo amor pela aviação que, a mim, me transportou para tempos que não vivi, mas que, ainda assim, consegui sentir, através das próprias palavras do comandante Marcelino, das fotografias e de relatos da época.

 Nome digno de ser sublinhado
Agradeço-lhe, comandante, uma vez mais, e em primeiro lugar, por tudo o que fez pela aviação. E, em segundo, por me ter facilitado em muito a tarefa… Meticuloso e organizado, foi, ao longo dos anos, sublinhando em jornais, revistas e documentos de toda a espécie o seu próprio nome, sempre que o mesmo era referido. É de facto um nome digno de ser sublinhado. Tanto por razões profissionais como pessoais.
Além de ter sido um profissional ímpar, foi também um ser humano extraordinário, de qualidades raras nos tempos em que vivemos e que será sempre um exemplo para os seus pares. Um verdadeiro cavalheiro que viveu como quis: profundamente apaixonado. Pela família e pelos aviões, que frequentemente comparava… às mulheres. Numa das nossas conversas disse-me: “Quando se ama uma mulher, não se consegue tratá-la mal, pois não? O mesmo acontece com os aviões. Quando os amamos mesmo a sério, não podemos fazer mal o nosso trabalho e voá-los mal, pois não?”. Não, comandante. Dito por si, acredito que seja tão simples quanto isso…
Foi no dia 19 de outubro. Triste dia. Grande homem. Resta o consolo de saber que as estrelas não morrem. Apenas mudam de lugar… Boa viagem, comandante Marcelino. Obrigada pelas lições. É uma verdadeira honra tê-lo conhecido e ter “voado” consigo.

Fonte: Jornal TAP Dezembro 2012